A minha trajectória artística começou cedo em terras de África, com a orientação de uma exigente Mestra de Arte, que me iniciou no desenho e na pintura a óleo, lançando as raízes para o meu futuro artístico que progrediu desde então até hoje. Desse período ficaram o gosto pelas cores quentes, fortes e sensuais, mas às vezes perturbadoras, que eu vou intercalando com tons mais frios e serenos, a liberdade do traço e a singularidade da imagem intimista que me caracteriza. Este interesse pela arte fez a minha carreira, pautada por dezenas de exposições em Portugal e no estrangeiro e a manutenção de uma Academia de Arte, onde, ao lado de alunos interessados, se exploram todas as técnicas e temas, do clássico ao contemporâneo.

O processo criador é um percurso árduo com um objectivo a atingir e um mundo de mistérios a penetrar. Como pintora, eu pretendo que as minhas obras sejam o reflexo de mim e do que sinto na complexidade da minha mente e do meu ser. Num enredo de imagens, problemas, hipóteses, soluções, encontros e desencontros, eu procuro em cada quadro a realização de mim própria, numa renovação que se repete sempre que uma nova obra é realizada. A minha obra é uma constante pesquisa de emoções e sentimentos e a figuração nela existente não é mera imitação da realidade do homem ou da natureza, mas sim a projecção de símbolos da vitalidade criadora que me plenifica e com a qual me identifico.

Ao longo da minha carreira fui trabalhando por séries, desde o figurativo ao abstrato.  Fascina-me a riqueza da série "Mitologia", uma expressão artística que caracterizo pela exuberância das formas, pelo resplendor do ouro, pelo horror ao vazio muito à imagem do Barroco, com a sua linguagem própria de excessos, profusão de ornamentos, teatralidade e extravagância. Neste processo de pesquisa, encontrei na beleza dos azulejos, inspirados nos séculos XVII e XVIII, no contemporâneo, ou simplesmente de livre criação e expressão atemporal, a melhor forma para desenvolver um projeto pessoal e único pois os azulejos fazem parte de um património artístico caracteristicamente português, em particular durante o período Barroco. 

Na minha última série “Atman", eu desenvolvo um tema que me envolve e seduz há longos anos…a Dualidade do ser humano, caracterizada pelo rosto dividido de uma mulher, que de olhos fechados olha o seu interior, a sua dimensão feminina, espiritual e física, a deusa eterna, geradora de vida. Em termos filosóficos “Atman”, é o mais elevado princípio do ser humano, é o sopro de vida. Reflexo da Alma universal, é a minha essência divina…o meu espírito individual, único e indivisível. É a ideia abstrata do meu “Eu” superior, integrado e indiferenciado do Universo, mas que, na Dualidade que me é própria…me torna humana.

Distinguem-me as minhas origens africanas, os meus gostos, as minhas crenças e a influência de duas culturas distintas. Movimentando-me à vontade em todos os materiais e técnicas, enfrento em cada pintura o desafio de dar forma plástica às minhas vivências e ao meu sentir que justifica esta vontade férrea de transmitir algo de original a quem observa a minha obra, de acrescentar qualquer coisa de inédito ao já existente, algo que deslumbre, arrebate e desperte as emoções mais profundas no observador tal como o Barroco desejava alcançar, algo que sirva de ponte entre o passado e o presente e faça pensar nesta ligação inseparável da evolução do ser humano.